NOTÍCIAS
Artigo – Registro civil: há que se ter algum limite na criatividade onomástica
18 DE MARçO DE 2024
Uma recente e importante alteração legislativa na área do registro civil foi a flexibilização da imutabilidade do nome.
O advento da Lei nº 14.382/2022 rompeu a rigidez, permitindo a alteração extrajudicial: do nome de recém-nascidos nos primeiros 15 dias após o registro de nascimento; do prenome após a maioridade e independente de prazo; para inclusão ou exclusão posterior do sobrenome em caso de união estável, casamento, divórcio ou quando não se adotou um dos sobrenomes de família no momento do registro.
O avanço é significativo na medida em que é bastante comum conhecermos alguém que não gosta do próprio nome, seja porque os pais usaram a criatividade e o resultado ficou estranho, seja por motivo íntimo, por ser extenso ou de grafia pouco usual.
Quando exercia a advocacia, a única alternativa à época era judicializar, razão pela qual foi proposta ação para que o prenome composto de uma cliente se reduzisse apenas a Maria.
Na audiência, o juiz afirmou que a retificação era desnecessária, pois o prenome a ser alterado era muito comum, não constrangia e inclusive era o da escrivã ali presente. Inesquecível o momento em que a autora interpelou a referida servidora perguntando se gostava de ser chamada de “Corrinha”, ao que a moça respondeu chorosa que era horrível… E assim, nasceu uma radiante Maria.
Nada contra o referido nome composto ou qualquer outro, mas o fato é que as preferências onomásticas são muito pessoais, assim: alguém pode gostar e o outro indivíduo não, sendo que aquele que se sentir incomodado tem direito à retificação extrajudicial.
Por ser um elemento identificador na sociedade, o nome é intrínseco à pessoa humana e integra o direito da personalidade. Assim, todo indivíduo tem não só o direito a um nome, mas de se identificar e gostar do próprio prenome em face do princípio da dignidade humana.
Registrador civil deve estar atento
Em relação aos menores de idade, é obrigação do registrador civil de pessoas naturais zelar pelos seus interesses e bem-estar, abstendo-se de registrar prenomes que possam causar exposição ao ridículo ou constrangimentos ao portador (artigo 55 § 1º da Lei nº 6015/73).
Infelizmente esse cuidado nem sempre é observado, sendo notórios inúmeros casos de prenomes diferentes, como Xérox e Karimbo; junções de nomes pouco usuais; troca ou acréscimos de letras W, H, Y e K que formam palavras impronunciáveis. O constrangimento ou satisfação de portar um nome diferente só a pessoa pode mensurar.
Atualmente, a tendência entre os pais é querer denominar os rebentos como personagens do anime Naruto; de séries de vampiros, demônios e seres intergalácticos; utilizar sobrenomes de atletas como prenomes (de preferência terminados com Vic); inspirar-se em locais, constelações ou planetas como nome neutro ou unissex e até utilizar o mesmo prenome em filhos de sexo diferente, diferenciando-os por ser composto, como por exemplo irmãos Zion Maria e Zion José.
Cabe ao registrador intervir, ponderar e eventualmente vetar, quando entender que o nome diferente pode trazer prejuízo futuro ao registrado. É evidente que se trata de uma questão delicada e subjetiva, hipótese em que se os pais insistirem, caberá consultar o juízo competente para autorizar ou negar a lavratura do registro de nascimento com aquele prenome.
Em se tratando de pessoas maiores e capazes, por terem pleno discernimento e condições de avaliar a repercussão que a adoção de um nome pouco usual trará em sua vida após a alteração no registro de nascimento, a intervenção do registrador é limitada, restringindo-se a observar se a documentação foi apresentada, se não há indícios de fraude, má-fé ou simulação quanto à real intenção do requerente na alteração ou de burla à alguma regra registral (artigo 56 § 4º da Lei nº 6.015/73).
Adição de sobrenomes
Situação que tem ocorrido é a tentativa de acrescer sobrenomes, normalmente estrangeiros, sob alegação de alteração de prenome. A inclusão de sobrenome é possível nas hipóteses legais e desde que devidamente comprovado o vínculo com o cônjuge, companheiro ou ascendente portador daquela designação familiar (artigo 57 I da Lei nº 6015/73).
Assim, querer incluir como prenome um apelido de família que não é da sua ascendência não deve ser autorizado extrajudicialmente. Muitas vezes, no intuito de conseguir a inclusão, o interessado apresenta notícias de pessoas cujo prenome é um sobrenome.
Veja bem: não é por que alguém foi registrado com prenome Silva, Bertolucci, Milosevic ou Hitler por exemplo, que outra pessoa pode exigir essa mesma “prerrogativa”. Um registro eventualmente equivocado não justifica nem obriga a lavratura de outros. Não se pode inventar sobrenomes e muito menos tentar fazê-lo sob alegação de que há pessoas com aquele prenome.
Importante observar que exceções sempre existirão, como por exemplo o pai se chamar Silva da Silva e o filho pleitear o nome Silva da Silva Filho, hipótese em que há justificativa plausível para a adoção do novo prenome; bem como nas situações em que for evidente que não há a intenção de inventar uma ascendência inexistente.
Portanto, a pessoa maior de idade pode solicitar a alteração do prenome independente deste ser vergonhoso, feio ou estranho pois o motivo da alteração é irrelevante. E a escolha do novo prenome é livre, na medida em que supostamente tem discernimento para escolhê-lo quando pleiteia a alteração do original.
Nesses casos, a intervenção do oficial de registro é excepcional e fundamentada na proteção das normas registrais. Não cabe análise de adequação do prenome escolhido pelo registrado adulto, ainda que o mesmo queira alterar para Xérox por exemplo. Por outro lado, uma vez alterado o registro, a desconstituição da retificação dependerá de sentença judicial.
Concluímos enaltecendo a intenção do legislador, que teve a sensibilidade de facilitar a alteração do prenome para dar dignidade a tantos brasileiros que passam a infância e até a vida inteira sofrendo constrangimentos com nomes estranhos, vexatórios, difíceis de pronunciar ou escrever e que agora podem retificar de forma simplificada e rápida extrajudicialmente. Entretanto, na adoção do novo prenome há que se ter algum limite, se não for jurídico, que pelo menos prevaleça o bom senso.
Fonte: Conjur
Outras Notícias
Anoreg RS
Provimento nº 19/2024-CGJ acrescenta os parágrafos 4º e 5º ao artigo 4º da Consolidação Normativa Notarial e Registral
22 de março de 2024
Provimento nº 19/2024-CGJ acrescenta os parágrafos 4º e 5º ao artigo 4º da Consolidação Normativa Notarial e...
Anoreg RS
Casamento em cartório oficializa amor entre mulheres
22 de março de 2024
Casamento em cartório oficializa amor entre mulheres
Anoreg RS
Artigo – Aspectos fiscais na constituição de holdings familiares: Planejamento tributário e eficiência fiscal
22 de março de 2024
Artigo – Aspectos fiscais na constituição de holdings familiares: Planejamento tributário e eficiência fiscal
Anoreg RS
Artigo – Cuidados no planejamento sucessório e patrimonial e a recente IN 2.180/24
22 de março de 2024
Artigo – Cuidados no planejamento sucessório e patrimonial e a recente IN 2.180/24
Anoreg RS
Projeto beneficia proprietário em processo de averbação de imóvel
21 de março de 2024
Projeto beneficia proprietário em processo de averbação de imóvel